Vilar de Mouros pouco convincente ao segundo dia
Chocolate amargo e as estrelas de david Fonseca
A segunda noite da oitava edição do Festival Vilar de Mouros fechou com a actuação de David Fonseca no palco principal. O ex-vocalista dos Silence 4 foi cabeça de cartaz e brilhou ao som das estrelas, depois do concerto morno de Rufus Wainwright.
Num dia considerado calmo, em que foram os Blasted Mechanism quem recolheu os frutos de um público que temia um cartaz fraco, Sing Me Something New, primeiro registo a solo de David Fonseca, veio pela primeira vez aos palcos de um grande festival. Chegou e convenceu, mostrando que o rapaz de Leiria tem talento e presença – é coisa que não lhe falta.
Someone That Cannot Love agradou aos fãs de David Fonseca – já se previa –, mas nada mais do que isso. Em Revolution, pareceu andar à procura de um caminho mais seguro, numa fórmula que primou pela originalidade de um cantor com foco e sirene policial na mão, ao invés de In Love With Yourself que potenciou o devaneio de um amor próprio.
A confirmar a sonoridade pouco prática para certames musicais, tanto David como Rufus viram muito público a optar mais pela circulação do que propriamente em assistir a tempo inteiro aos seus espectáculos.
A migração da plateia foi mais evidente quando Mad Professor lançou, no palco secundário, os watts exorbitados provenientes do Dub. Na presença de centenas de adeptos e de outros tantos fugitivos, os Dubadelics continuaram serão dentro.
Estreia inglória
A voz magistral de Rufus Wainwright abriu o espectáculo da pop teatral com Agnus Rei. Apesar das palmas que acompanharam o tema mais conhecido «Cigarettes and Chocolats», muitos dos que assistiam não resistiram mais do que três ou quatro músicas, na expectativa de saber quem era um tal de «Rufus». Se para uns era arte, outros houve que repeliram o talento do canadiano e preferiram sair de perto do palco, ou juntar-se em grupos na habitual fumaça. Houve ainda quem preferisse beber e comer, próximo da área comercial instalada no recinto.
Uma estreia inglória para Rufus Wainwright que pisou pela primeira vez terrenos lusos ao sabor de um chocolate amargo. Verdade seja dita, e o músico merece a importância devida: nunca uma sonoridade destas deveria ter sido englobada num festival, muito menos, na actuação seguinte a uns Blasted eléctricos. Rufus teria brilhado numa sala mais intimista.
Na viola ou no piano, o estreante entregou-se da mesma maneira e conferiu uma sensibilidade única de quem tem o dom de uma voz doce e terna, escrita em letras que transmitem a sua forma de ver o mundo.
Pôr do sol de Lenine
Antes, às 20 horas em ponto, o sol escondeu-se por entre as árvores para ouvir Lenine cantar. O cenário magnifico de um fim de tarde na aldeia, extravasou a impotência do pouco público nos primeiros acordes. Depois a música foi outra e o pop-rock com cheiro a brasil lançou Lenine no espaço sideral do seu misticismo de leão, confirmado pela sua juba dourada.
Entre outras palavras que dirigiu à plateia, o criador de O Dia em que Faremos Contato – editado em 1997 – apreciou ser compreendido, para lá da importância de cantar e de ser ouvido. O seu último trabalho (2002), Falange Canibal, marcou presença assídua até ao limiar da noite.
Sem impressionar, os Los Planetas, chegaram viram e tocaram. Sem rodeios. Uma música solta, ora em inglês, ora em espanhol, mas que fluía por entre os ouvidos «aterrados» dos festivaleiros.
O ambiente continuava inóspito. Ainda faltavam três bandas e poupava-se energia no recinto minhoto para uma noite que podia ser longa nos meandros do Dub do palco Stout. Muitos ainda permaneciam sentados sobre a erva enquanto se ia queimando o tempo. Devagar, com paz, amor e muita calma.
Preparados
Arrebatadores, os Blasted Mechanism, soltaram-se em Vilar de Mouros e fizeram levantar as almas mais adormecidas. Are you ready?, era a pergunta colocada no ar. O som psicadélico-experimental, variado entre uma fusão de rock, electrónica e world music, com a intemporalidade dos tribalismos, era apoiado por uma estrutura de vestimentas fantasmagóricas e uma componente espectáculo marcante. Ambientes diferenciados, e a multidão apanhada pela viagem de Plasma e Namaste, álbuns datados de 1999 e 2002, respectivamente.
Habituados a estas lides, a banda de Vald’jiu, Karkov e Ary mostrou a experiência adquirida nos concertos académicos de lés a lés de Portugal. Sábios na arte do entertainment, os Blasted merecem nota bem acima da média.
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Programa
Ao terceiro dia, Vilar de Mouros prepara-se para um cartaz de luxo. Mike Patton (Faith no More, Mr. Bungle e Fantômas), actua no segundo grupo onde vai mostrar o Mit Gas dos Tomahawk (21 horas), mas as suas influências estendem-se até aos Melvins (20 horas), banda rock oriunda da área de Seattle que abre o último dia.
The Wailers (22.20 horas) prometem trazer o reggae da Jamaica e a omnipresença de Bob Marley. Depois entra a magia de Tricky (23.40 horas) e um dos momentos mais aguardados: a segunda estreia de Vilar de Mouros 2003, que traz pela primeira vez a Portugal os americanos Public Enemy (1.30 horas). A sua música denúncia injustiças sociais e eternizou-se com o mítico Fuck The Police.
Na Quinta dos Portugueses, é a vez de Ironic Speech (17 horas), Philarmonic Weed (18 horas) e de LF Cool (19 horas).
A noite termina com Zion Train, no Palco Stout, quando o relógio ultrapassar as 3.30 horas.
Ivo Almeida